Reduzir a produção já seria suficiente para viabilizar a reciclagem
A Conferencia de assinatura do Primeiro Tratado Internacional aconteceu na cidade uruguaia de Punta del Este , do día 28 de novembro a sexta-feira 2 de dezembro, e contou com a representação de mais de 100 países. As negociações do tratado contarão com mais quatro conferências organizadas pelo Comitê Intergovernamental de Negociação (INC), o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) será o responsável por convocar a conferência diplomática para serem adotadas as medidas decididas nas conferências do INC.
“Sabemos que o mundo tem um vício plástico, o mundo criou uma crise plástica”, disse Inger Andersen, Sub-Secretária Geral da ONU e Diretora Executiva do PNUMA, durante uma coletiva de imprensa. “E os plásticos têm efeitos nocivos à saúde, eles deixam uma grande pegada…. mas isto não é uma guerra ao plástico em si, é uma guerra ao plástico no meio ambiente”. “Isto significa que devemos trabalhar em conjunto com o setor privado, com a comunidade, com os defensores do meio ambiente, com a liderança política, para continuar a construir o caminho a seguir”, disse.
ONU no Uruguai
A luta, para o Ministro de Ambiente do Uruguai, Adrián Peña, é contra ”a poluição plástica e contra alguns usos, como o hábito de usar e jogar fora”, para ele a chave é “como administramos o plástico, como o reciclamos, analisamos os aditivos que são utilizados para que tenha um melhor resultado”, em resumo, o problema é o hábito de jogar fora de descartar com a mesma velocidade que consumimos.
Os plásticos representam pelo menos 85% do lixo marinho, a cada minuto, o equivalente a um caminhão carregado de lixo plástico é despejado nos oceanos e se nada for feito a respeito, até 2040, o equivalente a 50 kg de plástico será projetado para entrar no oceano por cada metro de costa ao redor do mundo a cada ano, diz a ONU, e assim, num futuro próximo poderá haver mais plástico do que peixes no mar.
Mais massa de plásticos do que animais
No entanto, para Melanie Bergmann, do Instituto Alfred Wegener, pesquisadora que escreveu artigo sobre o assunto e participou da conferência, reduzir a produção já seria suficiente para viabilizar a reciclagem. No momento, é mais barato produzir plástico a partir de combustíveis fósseis, do que da reciclagem, e é aí que reside o cerne da questão: “A redução na produção de novos plásticos também deve aumentar o preço e a demanda por plástico reciclado, de modo que a reciclagem se torne realmente econômica” falou.
A quantidade de aplicações dos plásticos faz com que a sua massa atual represente “mais do que a massa de todos os animais terrestres e marinhos juntos” e é “impossível garantir a segurança de todo o plástico e produtos químicos existentes” por causa do ritmo a que surgem e aparecem no ambiente, numa “forma de poluição irrecuperável e irreversível”, alerta a bióloga e pesquisadora alemã.
Um oceano livre de plásticos
Para a engenheira ambiental, Lara Iwanicki, autoras do estudo Um Oceano Livre de Plásticos, publicado em 2020 e que se tornou referência sobre o assunto no país: “À medida em que o plástico continua a inundar os oceanos – no Brasil, a estimativa é de 325 mil toneladas/ano -, a lista de espécies marinhas afetadas por detritos plásticos aumenta”, “dezenas de milhares de organismos marinhos estão ingerindo plásticos, desde zooplâncton [pequenos animais semelhantes a insetos], peixes e tartarugas, mamíferos e aves marinhas, muitos deles já ameaçados de extinção. As espécies marinhas não apenas estão tendo contato com resíduos da produção humana, mas também estão morrendo devido a eles”, alertou a engenheira gerente de campanhas da Oceana Brasil.
Os dados são chocantes: mais de 800 espécies de mamíferos, aves marinhas, peixes e tartarugas estão sendo impactadas pelo emaranhamento de redes de pesca ou pela ingestão de plástico. Além disso, aproximadamente 90% de espécies de aves marinhas e tartarugas já consumiram plásticos, e o 17% das espécies de animais marinhos afetadas por tais detritos estão listadas como ameaçadas ou quase ameaçadas de extinção no Brasil pela União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN).
Essa triste realidade onde 1 em cada 10 animais marinhos no Brasil que apareceram mortos em praias das regiões Sul e Sudeste – únicas que mantêm uma estrutura de pesquisa e monitoramento ligados às bacias da Petrobras – tiveram a ingestão de plástico como causa do óbito. Entre 2015 e 2019, das 29.010 análises em corpos de golfinhos, baleias, aves e répteis, 3.725 continham algum tipo de detrito não natural no organismo. Cerca de 13% foram a óbito por conta da ingestão desses poluentes, sendo que 85% eram de espécies ameaçadas de extinção.
Esponja minúscula
Daniel Pauly, biólogo marinho e professor universitário franco-canadense reconhecido como um dos principais especialistas do mundo em recursos marinhos, especialista em pesca e um dos mais renomados cientistas do mundo, destaca que, “até a década de 1950, os animais marinhos tinham que lidar apenas com detritos e lixo na forma de substâncias orgânicas ou objetos que eram produzidos por plantas ou animais (Isso incluía madeira, fibra, carne podre, ossos ou outros materiais que poderiam ser degradados por bactérias e fungos e, assim, transformados em nutrientes ou convertidos em minerais inofensivos). Por bilhões de anos, esses organismos microscópicos reciclaram matéria orgânica na Terra e em nossos oceanos, e literalmente mantiveram nosso mundo limpo. Isso mudou radicalmente com o surgimento dos plásticos”, explicou Pauly. Fundador e principal pesquisador do projeto Sea Around Us, do Instituto de Oceanos e Pesca da Universidade de Columbia Britânica, ele também é membro do Conselho da Oceana.
Segundo Pauly, a atenção para o perigo dos microplásticos nos animais marinhos é porque eles têm a propriedade de repelir água (lipofílico), assim como ocorre com os piores venenos que a indústria química produz. Como DDT (sigla de diclorodifeniltricloroetano), PCB (bifenilas policloradas), dioxinas, etc. “Isso significa que cada pedaço deste tipo de micro plástico no oceano atua como uma esponja minúscula para os vários venenos que as indústrias química e de energia descartaram em vias navegáveis ou no ar, e que acabam no mar, onde se acumulam”.
Dessa forma, esses produtos químicos se grudam às microfibras, transformando-as em pequenas pílulas de veneno que acabam sendo consumidas por zooplâncton; que, por sua vez, armazenam substâncias lipofílicas na gordura de seus pequenos corpos. “O nome disso é bioacumulação. O zooplâncton é, então, consumido por pequenos peixes, como sardinhas e anchovas, que são depois consumidos pelo atum e depois … bon appétit”, lamenta Pauly.
Fontes:
https://diariodoturismo.com.br/animais-marinhos-no-brasil-plastico-mata-1-em-cada-10/
Produtor e documentalista, investigador, escritor, jornalista e amigo da natureza.